Maior rigor para balanço social
Publicações serão avaliadas por várias organizações antes de terem o selo do Ibase
O Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), organização fundada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, e responsável pela formulação do modelo mais difundido de balanço social no Brasil, está propondo, para este ano, o aumento do monitoramento das práticas de responsabilidade social das empresas.
As empresas que se candidatarem à obtenção do selo Balanço Social Ibase/Betinho para este ano terão, a partir de agora, seus nomes submetidos à apreciação de organizações da sociedade civil, das áreas de direitos trabalhistas, consumidores, diversidade de gênero, movimento negro e meio ambiente. Atualmente, 64 empresas possuem o selo da entidade.
As informações prestadas pelas empresas ficarão disponíveis também para os cidadãos comuns, a partir do endereço eletrônico http://www.balancosocial.org.br. “Será um espaço aberto para que qualquer pessoa possa se manifestar sobre as ações concretas dessas empresas, positiva ou negativamente”, explica Ciro Torres, coordenador de responsabilidade social e ética do Ibase.
O objetivo, segundo Torres, será aumentar a vigilância sobre as práticas das empresas. “Vamos envolver outros setores da sociedade, além das empresas, nas discussões sobre responsabilidade social. Até então, o assunto estava restrito a entidades empresariais”, diz. Segundo ele, o Ibase, como responsável pela concessão do selo, não tem condições de fiscalizar as práticas das empresas no interior do País.
Desde que o selo Balanço Social começou a ser considerado um atestado de boas práticas empresariais, no final dos anos 1990, houve apenas um caso de suspensão do selo, por não-cumprimento da empresa de critérios sociais. Em 2004, o Ibase tomou conhecimento de uma Ação Civil Pública contra o Grupo José Pessoa, de açúcar e álcool, movida pelo Ministério Público do Trabalho. A acusação era que havia trabalhadores em situação de semi-escravidão em uma das usinas do grupo, a Santa Cruz, em Campos dos Goytacazes (RJ). Na época, a empresa alegou se tratar de uma unidade recém-adquirida, e que ainda não tinha total conhecimento das condições de trabalho no local.
A suspensão do uso do selo pelo Ibase, no entanto, motivou uma mudança de atitude por parte do grupo, que se comprometeu a monitorar de modo mais sistemático as práticas de suas usinas. Passou a adotar, em seus contratos com fornecedores, cláusulas coibindo o trabalho infantil e escravo e se tornou signatária do Pacto Empresarial Contra o Trabalho Escravo, assinado por mais de 50 empresas. “O setor sucroalcooleiro ainda é introspectivo em responsabilidade social, mas vamos avançar na proliferação desse comportamento”, afirma José Pessoa de Queiróz Bisneto, presidente do Grupo José Pessoa.
Vigilância
Os novos critérios do Ibase encontram eco em um movimento internacional de vigilância às corporações, forte nos Estados Unidos e na Europa, por meio de ONGs como o CorpWatch (EUA), o GermanWatch (Alemanha) e o Somo (Holanda), que monitoram práticas das empresas multinacionais nos países emergentes.
No Brasil, já existem casos em que a pressão da sociedade civil modificou práticas das empresas. No ano passado, o consórcio Baesa, formado por cinco investidores para construção da usina hidrelétrica de Barra Grande, na divisa entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina, foi obrigado a abrir diálogo com um grupo de ONGs que ameaçaram denunciar o consórcio à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), caso a barragem alagasse uma área maior do que a necessária.
Também recentemente, um grupo de 40 ONGs ligadas ao movimento de igualdade racial reclamou da campanha publicitária da marca Dove, da Unilever, veiculada desde outubro do ano passado, e que mostra mulheres comuns, gordas e magras, em vez de modelos. Segundo as entidades, que compõem o movimento “Diálogos contra o racismo”, não havia negras na campanha veiculada na TV.
A gerência da marca Dove afirmou em nota que veicula mulheres negras na publicidade da marca desde 1988. Segundo a gerência, “a posição da marca não é trabalhar a questão racial, mas sim a diversidade física de cada mulher.” No entanto, as ONGs celebram o fato da campanha mais recente, que começou a ser veiculada em dezembro, trazer mais mulheres negras.
Fonte: VIALLI, Andrea. Maior rigor para balanço social. O Estado de São Paulo, São Paulo, 08 fev. 2006.